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6 de fevereiro de 2025

Por que queda de popularidade de Lula chegou ao Nordeste


A queda da popularidade do presidente Luiz Inácio Lula da Silva em janeiro — um "tombo histórico", nas palavras do ex-presidente do PT José Dirceu — assustou o Palácio do Planalto e o partido. Um dos pontos que gera especial preocupação no governo é o impacto da piora da avaliação no Nordeste, região que se tornou um bastião petista nas disputas presidenciais desde 2006 — e a única em que Lula derrotou o ex-presidente Jair Bolsonaro em 2022. A vitória larga no Nordeste, em que Lula recebeu 69,3% dos votos válidos, cerca de 12,5 milhões a mais do que Bolsonaro, foi determinante para sua eleição apertada nacionalmente (50,9% contra 49,1%), em que a diferença de votos ficou em apenas 2,1 milhões.

A pesquisa que acendeu a luz amarela no governo foi um levantamento do instituto Quaest, do final de janeiro, mostrando que a avaliação negativa do presidente superou a positiva pela primeira vez desde o início do mandato, em janeiro de 2023. Segundo essa pesquisa, que ouviu 4.500 pessoas entre 23 e 26 de janeiro em todo o país, o percentual dos brasileiros que reprova o trabalho de Lula subiu de 47% para 49%, na comparação com dezembro. Já o dos que aprovam caiu de 52% para 47%. A maior queda da avaliação positiva veio do Nordeste, onde o percentual de aprovação recuou de 67% para 60% no mesmo período de comparação.

Nome histórico do PT e ministro de Lula em seu primeiro mandato, José Dirceu escreveu em artigo publicado na semana passada no jornal Folha de S.Paulo que "a popularidade do governo tomou um tombo histórico no meio do terceiro mandato do presidente", ao citar os dados da Quaest. "O mais importante: algumas das maiores perdas de aprovação se deram entre os mais pobres, os moradores do Nordeste e as mulheres, segmentos que ajudaram Lula a derrotar Jair Bolsonaro nas urnas em 2022", continuou.

Já a governadora do Rio Grande do Norte, Fátima Bezerra (PT), disse ao jornal O Globo também na semana passada que o apoio do Nordeste a Lula não está garantido em 2026. Ela cobrou mais presença do governo na região e "muita atenção para os investimentos previstos para corresponder às expectativas da população". A BBC News Brasil conversou com analistas políticos nordestinos e eleitores de Lula na região para entender a piora do humor com o governo.

O principal fator apontado é a menor capacidade de consumo, com o aumento da inflação, em especial dos alimentos, e a alta de impostos pesando no bolso da população, a exemplo da taxação das importações adotada em julho, conhecida como "taxa das blusinhas". Especialistas apontam também a dificuldade do governo em dialogar com trabalhadores informais e pequenos profissionais liberais, comuns na região que tem a maior taxa de desemprego do país — 8,7% no terceiro trimestre de 2024, segundo o dado mais recente do IBGE, contra 6,4% na média nacional.

A cientista política Monalisa Torres, professora da Universidade Estadual do Ceará (UECE), nota que o eleitor lulista do Nordeste vota no petista, principalmente, por causa dos bons resultados sociais e econômicos dos seus primeiros governos, e não pelas ideias progressistas da esquerda. Hoje, no entanto, ela vê dificuldade para Lula repetir o desempenho dos primeiros mandatos. Para Torres, o cenário é mais desafiador agora, citando como exemplo a disputa com o Congresso pelo controle do Orçamento, após a forte expansão das emendas parlamentares.

"Havia muita expectativa num governo que entregou muito em outro momento e, agora, a despeito das promessas, não consegue entregar os mesmos resultados. Isso gera frustração e impacta a avaliação", avalia. Para ela, a forte polêmica que atingiu o Pix em janeiro também pode ter afetado a popularidade de Lula.

No início do ano, a Receita Federal ampliou o monitoramento das transações por Pix e cartão de crédito, com objetivo de combater transações ilícitas. Com a mudança, todas as instituições financeiras, inclusive bancos virtuais e aplicativos de pagamentos, teriam que reportar movimentações que somassem mais de R$ 5 mil no mês, no caso de pessoas físicas, e mais de R$ 15 mil, no caso de empresas.

Antes, o monitoramento já ocorria, mas apenas em instituições financeiras tradicionais, como bancos e cooperativas de crédito. A medida, porém, passou a ser vista como uma ameaça à população. Lideranças bolsonaristas, como o deputado Nikolas Ferreira (PL-MG), espalharam a informação falsa de que o governo poderia taxar o Pix — meio de pagamento gratuito que se popularizou no país. Em vídeo que atingiu mais de 300 milhões de visualizações, Ferreira disse que os mais afetados seriam trabalhadores informais, como ambulantes, feirantes e entregadores. Apesar de a informação sobre a taxação do Pix ser falsa, o impacto foi tamanho que o governo recuou da ampliação do monitoramento.

Para Torres, houve uma falha de comunicação da gestão Lula em explicar melhor a medida. Na sua leitura, isso foi intensificado porque já havia um aumento do desconforto com o governo após medidas como a taxação das importações online, em sites como Ali Express, Shein e Shopee. Nikolas Ferreira inclusive associa as duas medidas em seu vídeo sobre o Pix. "O Pix não será taxado. Mas é bom lembrar que a comprinha da China não seria taxada e foi", ironizou o deputado.