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13 de maio de 2019

Assassinatos caem 24% no 1º trimestre do ano no Brasil

O Brasil registra uma queda de 24% nas mortes violentas no primeiro trimestre deste ano em relação ao mesmo período do ano passado. É o que mostra o índice nacional de homicídios criado pelo G1, com base nos dados oficiais dos 26 estados e do Distrito Federal. Isso quer dizer que o país teve 3,2 mil mortes violentas a menos em janeiro, fevereiro e março deste ano em relação a 2018. O número de assassinatos, porém, continua alto.

De acordo com o levantamento feito pelos repórteres do G1, houve 10.324 mortes violentas no primeiro trimestre deste ano. Apenas o Paraná não informa os dados deste intervalo de tempo. Já no mesmo período de 2018, houve 13.552 assassinatos — também desconsiderando o Paraná, para que seja feita a comparação. O governo do Paraná informa que os números de janeiro, fevereiro e março ainda estão sendo tabulados para posterior divulgação.

A tendência de queda nos homicídios do país foi antecipada pelo G1 no balanço dos dois primeiros meses do ano, que apresentaram redução de 25% em relação ao mesmo período do ano passado, e no balanço das mortes violentas de 2018, que teve a maior queda dos últimos 11 anos da série histórica do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, com 13%.

Os levantamentos fazem parte do Monitor da Violência, uma parceria do G1 com o Núcleo de Estudos da Violência da USP e o Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Os dados apontam que: houve 3.228 mortes a menos no 1º trimestre de 2019 todos os estados do país apresentaram redução de assassinatos no 1º trimestre quatro estados tiveram quedas superiores a 30%: Ceará, Amapá, Sergipe e Rio Grande do Norte em números absolutos, o estado com a maior redução foi o Ceará, com 691 vítimas a menos.

Causas
Entre os motivos por trás da queda, segundo o pesquisador do NEV-USP Bruno Paes Manso e o diretor-presidente do FBSP Renato Sérgio de Lima, estão:

Diminuição da tensão entre as facções depois da crise nos presídios
“A rebelião de presos no Amazonas, Roraima e Rio Grande do Norte, em janeiro de 2017, atiçou a rivalidade entre grupos criminais, principalmente nos estados do Norte e Nordeste, onde o mercado de drogas e o interior dos presídios já era bastante competitivo e violento. A velocidade dos conflitos e a tensão nos presídios foi diminuindo ao longo de 2017 e 2018 com a interrupção de novos massacres.”

Mais instrumentos para atuar no comando das facções
“As autoridades estaduais passaram a ter mais instrumentos para atuar diretamente nas cadeias de comando nas prisões que davam os rumos dos conflitos criminais. Como o novo modelo de negócios criminais parte de decisões tomadas no interior dos presídios, as lideranças ficaram mais vulneráveis a ações do estado por meio de punições e transferências para presídios federais. Fica, portanto, mais difícil para esses grupos persistirem com os conflitos.”

Crise de 2017 como ponto de alerta
“A crise de 2017 fez com que os governos estaduais assumissem a nova configuração criminal em seus estados, articulada a partir dos presídios. A necessidade de interrupção das cadeias de comando vindas do sistema penitenciário se tornou preocupação urgente, aproximando autoridades de diferentes instituições, como Ministério Público e Executivo.”

Compartilhamento de políticas públicas entre todas as esferas
“Essas políticas compartilhadas que passam pela coordenação e integração de esforços entre União, DF, estados e municípios já vinham sendo articuladas desde a criação dos Gabinetes de Gestão Integradas, criados durante a Copa do Mundo de 2014. A crise dos presídios e o crescimento da violência em 2017 acabou provocando essas esferas de diferentes poderes (Legislativo, Executivo e Judiciário) e órgãos do estado (ministérios públicos, polícias, defensorias, guardas municipais, entre outros) a trabalharem juntas na tentativa diminuir uma situação que ameaçava fugir do controle.”

Interesses mútuos dos governos e das facções
“A redução dos conflitos e da violência interessava também às próprias facções, que, por atuarem em mercados rentáveis, têm muito dinheiro a perder com os custos envolvidos nas disputas com rivais. Nesse sentido, o esforço do Estado para cessar a crise ia ao encontro do interesse das organizações, que preferem ganhar dinheiro com o crime do que se envolver em conflitos predatórios e caros.”

Programas estaduais de redução da violência
“Houve um empenho localizado dos estados na execução de programas de redução da violência letal conforme suas realidades orçamentárias. Pernambuco revisou estratégias e retomou o Pacto pela Vida, programa premiado de redução de violência. No Recife, o Centro Comunitário da Paz (Compaz), ganhou destaque nas políticas públicas. Em Alagoas, o governo estadual implantou o Programa Força Tarefa, que busca esforços conjuntos. No Acre, o Ministério Público estadual passou a auditar as estatísticas policiais e cobra medidas quase que em tempo real quando ajustes são necessários, aumentando a ideia de planejamento integrado. Em Santa Catarina, a Polícia Militar tem investido em câmeras corporais instaladas nas fardas dos policiais, bem como em tablets de registro de ocorrências, programas de vizinhança que utilizam o WhatsApp para comunicação instantânea e já atingem uma rede de mais de 100 mil pessoas; e em operações ‘ferrolho’, que mapeiam todas as rotas e caminhos possíveis para a entrada de drogas e armas no estado. No Rio Grande do Norte, após as crises prisionais, o governo federal manteve ações durante um período prolongado no estado. No Rio Grande do Sul, programas de prevenção como o POD (Programa de Oportunidades de Direitos) foram acelerados, e o mais importante: investimentos na criação de área integradas entre a Polícia Civil e a Brigada Militar foram priorizados.”

Criação do Sistema Único de Segurança Pública
“Todos esses esforços resultaram na criação, no meio de 2018, do Susp (Sistema Único de Segurança Pública). Durante o ano, as eleições acabaram servindo como instrumento de pressão para os governos liberarem recursos para o setor, já que o tema era visto como prioritário para o eleitorado. Em dezembro de 2018, o país ganhou uma Política Nacional de Segurança Pública e Defesa Social pautada, exatamente, na articulação federativa e republicana; na ideia de que uma nova governança da segurança pública é necessária e possível.”

Pressão da opinião pública
“A pressão exercida por projetos como o Monitor da Violência, que passou a cobrar das autoridades estaduais a publicação de dados sobre homicídios e a ouvi-los sobre os resultados de suas políticas, expôs esses agentes à opinião pública. A rotina estabelecida na produção de informações acaba criando uma nova cultura para lidar com o problema, que passa a ser mais bem diagnosticado e enfrentado com maior inteligência e estratégia. Outros instrumentos importantes que já realizavam essa cobrança eram o Anuário Brasileiro de Segurança Pública e o Atlas da Violência, produzidos pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (parceiro do Monitor da Violência) e pelo Instituto de Pesquisas Aplicadas (Ipea).”

Ceará: a maior redução
Assim como no balanço do primeiro bimestre deste ano, o Ceará teve a maior queda no número de mortes violentas do país: 56%. O estado teve 546 assassinatos no primeiro trimestre de 2019, contra 1.237 no mesmo período do ano passado.

Em janeiro, o Ceará teve centenas de ataques coordenados por facções criminosas por conta de medidas anunciadas no governo para tornar a fiscalização nos presídios mais rígidas. Por isso, para o pesquisador Luiz Fábio Paiva, do Laboratório de Violência da Universidade Federal do Ceará (UFC), o que houve no estado foi “um regime de não conflito” entre as facções criminosas.

“Quando o Ceará estava sob forte ataque, era observado que havia situações que demonstravam um certo nível de cooperação desses grupos, sobretudo permitindo que determinados membros de uma facção passassem pelo território do outro sem sofrer alguma ação violenta”, diz Paiva.

De acordo com o secretário da Segurança Pública do estado, André Costa, a redução do número de homicídios ocorre desde 2018 devido a um “conjunto de ações” elaboradas em 2017. Entre as estratégias, diz, estão o combate à “mobilidade do crime”, evitando furto e roubo de veículos e recuperando automóveis roubados; investimento em ciência e tecnologia para estudar a atuação de criminosos; e ações da Secretaria da Administração Penitenciária, que dificultam a comunicação de presidiários que comandam facções criminosos e ordenam crimes de dentro das prisões.

Como o levantamento é feito
A ferramenta criada pelo G1 permite o acompanhamento dos dados de vítimas de crimes violentos mês a mês no país. Estão contabilizadas as vítimas de homicídios dolosos (incluindo os feminicídios), latrocínios e lesões corporais seguidas de morte. Juntos, estes casos compõem os chamados crimes violentos letais e intencionais.

Jornalistas do G1 espalhados pelo país solicitam os dados, via assessoria de imprensa e via Lei de Acesso à Informação, seguindo o padrão metodológico utilizado pelo fórum no Anuário Brasileiro de Segurança Pública. Em março, o governo federal anunciou a criação de um sistema similar. Os dados, no entanto, não estão atualizados como os da ferramenta do G1. O último mês disponível é dezembro de 2018.

Os dados coletados mês a mês pelo G1 não incluem as mortes em decorrência de intervenção policial. Isso porque há uma dificuldade maior em obter esses dados em tempo real e de forma sistemática com os governos estaduais. O balanço de 2018 foi publicado pelo Monitor da Violência separadamente, em abril.

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