O texto segue para votação no Senado. A
derrubada da medida foi capitaneada pelo presidente da Câmara, Henrique
Eduardo Alves (PMDB-RN), com apoio do PMDB, principal aliado do
Planalto, partidos da base aliada e da oposição. O PT, PC do B e PSOL, favoráveis à consulta popular, ficaram isolados na defesa da proposta. O projeto de Dilma foi rejeitado por votação simbólica, que não contabiliza os votos.
O decreto é polêmico. Partidos de oposição e alguns integrantes da
base governista alegam que o ato fere prerrogativas do Legislativo. Além
disso, dizem que a intenção do governo é aparelhar o processo de
decisão governamental, a exemplo do que ocorre na Venezuela.
O texto determina que os órgãos da administração pública federal
“deverão considerar” as novas regras, entre elas o desenvolvimento de
mecanismos de participação dos “grupos sociais historicamente excluídos”
e a consolidação “da participação popular como método de governo”. A expressão “deverão considerar” é central para o debate. O governo
diz que não há obrigação do gestor de submeter os atos aos conselhos,
apenas o estímulo. Oposição e congressistas têm interpretação contrária.
Além disso, o decreto estabelece orientações genéricas de como se
dará a composição desses conselhos. A norma instituiu a chamada Política
Nacional de Participação Social (PNPS), com o objetivo de “consolidar a
participação social como método de governo” e aprimorar “a relação do
governo federal com a sociedade”.
Atualmente, há 40 conselhos e comissões de políticas públicas no
Brasil, formados por 668 integrantes do governo e 818 representantes da
sociedade. As atribuições variam de acordo com cada conselho, que podem
ser consultivos, deliberativos, ou os dois. Para o líder do PT, Vicentinho (SP), a votação na Câmara foi motivada
por “birra pós-eleitoral”. “A presidente quer ampliar a participação
popular”, afirmou.
Autor do projeto que cancela os conselhos, o líder do DEM, Mendonça
Filho (PE), disse que era preciso reverter ” esse decreto bolivariano”. O deputado Lúcio Vieira Lima (PMDB-BA) disse que a rejeição do
decreto é educativa para Dilma. “Essa derrota é para manifestar que o
discurso de diálogo, pregado pela presidente, não pode ficar só na
teoria”, afirmou. “É uma votação histórica, é a manifestação de altivez desta Casa”, afirmou Alves.
RETALIAÇÃO
A derrota de Dilma foi colocada por petistas na conta pessoal de
Alves, que creditaram a movimentação à ressaca por sua derrota na
disputa pelo governo do Rio Grande do Norte. O presidente da Câmara
atribuiu ao PT, em especial ao ex-presidente Lula, que gravou vídeo para
seu adversário, seu desgaste nas urnas.
O peemedebista negou que a deliberação das propostas seja retaliação
ao governo. Ele afirmou que há três meses o projeto sobre os conselhos
estão como o item prioritário da pauta. Ao longo da sessão que durou
mais de duas horas, o deputado cobrou a presença dos parlamentares em
plenário e pressa nas falas dos deputados.
Segundo líderes aliados, Alves voltou com “sangue nos olhos”, sem
disposição para o diálogo. Antes de chamar a votação do decreto e marcar
para os próximos dias a análise de propostas com impacto fiscal, a
chamada pauta-bomba, o peemedebista cobrou o PT por ter manobrado para
impedir o avanço de uma proposta de reforma política fechada no ano
passado, após os protestos de junho.
A fala ocorre depois de a presidente Dilma Rousseff ter apresentado
como uma de suas principais bandeiras para o segundo mandato a
realização de plebiscito para discutir uma reforma. “Na Comissão de Constituição e Justiça, uma obstrução do PT impediu que
fosse votada [a proposta]. Então, não é apenas discurso de fazer [a
reforma política]. É tomar posições para perder ou para ganhar”, afirmou
Alves.
Alves costurou nesta terça o apoio dos líderes para destravar a
reforma política na CCJ. Ele recolheu 15 assinaturas em um requerimento
pedindo que a comissão analise a proposta discutida no ano passado. Entre as medidas que fazem parte desta reforma que está engavetada,
estão o fim da reeleição para cargos no Executivo, o fim do voto
obrigatório, facilidades para criação de partidos, medidas para
restringir a atuação de legendas com desempenho ruim nas eleições para
deputados federais, além de engessar alianças eleitorais.
Antes de desembarcar na Câmara, ele ainda conversou com o
vice-presidente, Michel Temer. Interlocutores disseram que Alves avisou
sobre o clima e a pauta complicada para o retorno da Câmara após as
eleições. Seguindo orientação de correligionários, ele evitou polemizar com o
ex-presidente Lula e afirmou que já “deletou” o episódio. Ele destacou
ainda que tem “maturidade” para entender “circunstâncias do momento”.