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1 de julho de 2019

Em 60 cidades do RN, circula mais dinheiro com aposentadoria rural do que com FPM

As cenas de aposentados aguardando benefícios previdenciárias em agências bancárias fazem parte do cotidiano do interior do Rio Grande do Norte. E é este dinheiro que sustenta boa parte do comércio e dos serviços nos rincões  potiguares. Isso se explica pelo fato que a soma dos recursos para a aposentadoria rural ser maior que os repasses anuais para o Fundo de Participação dos Municípios (FPM) em 60 das 167 prefeituras norte-rio-grandenses, segundo dados apurados pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag).

A pesquisa produzida pela entidade rural, a partir de dados coletados em 2018, indica que em 36% das cidades do Rio Grande do Norte circula mais dinheiro proveniente dos benefícios pagos pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) – aposentadorias por idade, invalidez e tempo de contribuição – do que por causa do FPM, a principal fonte de receitas de prefeituras do interior. A maior diferença entre o que o município recebe de aposentadorias e o FPM chegou a 736%. É o caso de Pau dos Ferros, no Alto Oeste potiguar. Em 2018, a cidade recebeu R$ 139 milhões da aposentadoria rural e R$ 16 milhões do Fundo de Participação.

A diferença superior a 400% entre os valores das aposentadorias e repasses do FPM também acontece em Apodi (461%), Santo Antônio (436,4%), João Câmara (430%) e São Miguel (414,1%). Ao todo, segundo a pesquisa, 30 cidades potiguares têm uma diferença superior a 100% entre os valores pagos dos benefícios previdenciários e os repasses federais.

Em 2018, para ratificar a importância dos recursos da seguridade social para o homem do campo, ao se somar os valores recebidos em benefícios nos 167 municípios, o Rio Grande do Norte teve R$ 2,9 bilhões. Já com o FPM, o valor total foi de R$ 2,6 bilhões. Ou seja, uma diferença de R$ 300 milhões. Até dezembro do ano passado, segundo a Contag, o Estado registrava 271.621 beneficiários de aposentadoria rural.

Este impacto financeiro dos benefícios rurais pode estar com os dias contados. Entidades representativas dos trabalhadores do setor rural temem que a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da reforma da Previdência, a PEC 06/2019, possa dificultar o acesso dos agricultores à aposentadoria, o que acarretaria em graves perdas econômicas para os municípios.

Para se ter uma ideia, em Pau dos Ferros, por exemplo, que registra 30.183 habitantes, os beneficiários das aposentadorias rurais representam 42% da população.

“Os pequenos comerciantes serão os maiores prejudicados com isso. Vai afetar a economia de vários municípios, e será uma maldade muito grande para os agricultores”, explica Jocelino Dantas, diretor executivo da Federação dos Trabalhadores Rurais do Rio Grande do Norte (Fetarn).

Apesar de o relator da PEC na comissão especial da Câmara Federal, deputado Samuel Moreira (PSDB-SP), ter expressado que os artigos sobre a aposentadoria rural foram retirados do texto, a Fetarn ainda está receosa de que a reforma possa recrudescer o acesso aos benefícios. “Os trabalhadores rurais sempre foram tratados como servidores especiais. Não precisam contribuir diretamente para a Previdência. E isso por um motivo simples: pela forma que eles vivem ou, melhor, sobrevivem”, aponta Jocelino Dantas.

As possíveis novas regras para a previdência rural delimitavam a obrigação de que os trabalhadores passassem a pagar um valor mensal de R$ 50. Além disso, o texto prevê que o tempo mínimo de trabalho do agricultor passe de 15 para 20 anos. “As mudanças não podem prejudicar o acesso do pequeno agricultor ao benefício”, lamenta.

Governo modificou sistema para os benefícios
Mesmo que a aposentadoria rural não seja contemplada na PEC da reforma da Previdência, isso não significa que o acesso do agricultor ao benefício não passou por mudanças. Em 20 de março, através da Medida Provisória 871, os trabalhadores rurais interessados em se aposentar conseguiram o direito de fazer o pedido sem precisar do intermédio de uma entidade sindical. Os agricultores podem fazer a declaração de atividade rural diretamente nas agências do INSS.

Segundo o Ministério da Economia, não será necessário que a autodeclaração seja ratificada por entidades públicas credenciadas pelo Pronater, o Programa Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural na Agricultura Familiar e na Reforma Agrária. Todo o trabalho de exame e ratificação será feito pelo próprio INSS.

Entretanto, segundo a Fetarn, as entidades sindicais ainda são necessárias para obtenção do benefício. “Não é em todo lugar que tem posto da Previdência Social”, aponta Jocelino Dantas.

Ainda segundo o governo federal, a intenção é melhorar a gestão do INSS, combater fraudes e irregularidades e reduzir os gastos com o pagamento de benefícios indevidos. Todavia, na opinião de Jocelino Dantas, a lei traz uma regra que obriga o trabalhador a comprovar cada ano de atuação no campo.

“O agricultor mais vulnerável foi o mais prejudicado. Aquele que não tem terra e que, para plantar feijão ou milho, atua esporadicamente na área de outra pessoa. A nova lei endureceu a comprovação de trabalho para estas pessoas. O combate das  fraudes não pode impedir que os agricultores consigam se aposentar”, finaliza.

Femurn defende manutenção de regras atuais
A Federação dos Municípios do Rio Grande do Norte (Femurn) aponta para a necessidade de manutenção das atuais regras da aposentadoria rural. A representação das prefeituras potiguares é signatária de um manifesto da Confederação Nacional dos Municípios (CNM). O documento pede que os municípios passem a integrar as propostas para o regime geral previstas na reforma que tramita no Congresso Nacional, sem mudanças na aposentadoria rural.

Segundo a CNM, a inclusão vai reduzir as despesas das prefeituras brasileiras em R$ 170 bilhões nos próximos dez anos. A entidade também quer a manutenção das regras atuais do Benefício de Prestação Continuada (BPC) e da permissão para que os regimes próprios de previdência realizarem empréstimos consignados.

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