“Se o trânsito hoje está caótico, com as pessoas passando por autoescola, imagina não passando. Eu não sei se o ministro quer voltar aos anos 1980. O trânsito era outro, ministro. Os veículos eram outros. Hoje, se botar uma pessoa não habilitada num trânsito caótico como nós temos, com uns carros que geram uma velocidade altíssima, eu não sei… acho que vai ser muito perigoso”, afirma Eduardo, em entrevista ao AGORA RN.
“Para se ter uma autoescola, tem que seguir uma resolução da Senatran (Secretaria Nacional de Trânsito). E o ministro sabe disso. Não é simplesmente ir lá, tirar um CNPJ e abrir uma autoescola. Tem uma resolução para cumprir. Tem que ter dois carros, no mínimo, duas motos, dois diretores, dois instrutores, dois computadores, duas impressoras. Isso é tudo duplo”, declara Eduardo Gaúcho.
Ele afirma ainda que, mesmo com o avanço da tecnologia, a lei ainda exige que as autoescolas tenham ensino presencial. Apesar disso, Eduardo Gaúcho entende que é necessário manter a obrigatoriedade das autoescolas, em nome da segurança no trânsito.
“Eu vou dar um exemplo aqui no Rio Grande do Norte. A taxa de habilitação é R$ 516,00 e tem colegas, proprietários de autoescola, que cobram uma habilitação de carro e moto por R$ 1.000,00. Então dá menos de R$ 1.600,00. Eu não sei mais o que vão baixar, porque a gente paga tudo que é imposto. A gente é CLT, os funcionários são tudo carteira assinada. Temos que apresentar tudo que é certidão para o Detran. R$ 1.600,00 paga uma vida?”, declara o presidente do SindCFC-RN.
A proposta também é criticada por quem está aprendendo a dirigir. Djadson Oliveira, de 20 anos, está fazendo aulas práticas na autoescola de Eduardo Gaúcho, a Vitória Sul, e diz que as aulas têm sido fundamentais para a sua preparação para o exame do Departamento Estadual de Trânsito (Detran).
“Se não há as aulas, como a gente chega lá no teste do Detran? O que pode acontecer (se a proposta avançar)? Gente que faz a prova, passa, mas não passou pelo treinamento. Está no trânsito, mas não sabe informação de sinalização. Isso pode ocorrer. Pode colocar em risco outros pedestres ou outras pessoas no trânsito. Na autoescola eu recebi muito mais aprendizado, conhecimento”, afirma o jovem.
Os donos de autoescolas reclamam que não foram consultados sobre a proposta que o ministro Renan Filho apresentou nesta semana. “Nós recebemos o comunicado com surpresa. As autoescolas têm um papel muito importante, tanto econômico como social”, afirma Renildo Duarte, do CFC Via Certa e um dos diretores do sindicato da categoria.
O presidente do sindicato acrescenta que as entidades do segmento não foram consultadas sobre mudanças na formação de novos condutores. “Vale ressaltar que, desde que começou o Governo Lula, nesta mandato, a Câmara Temática não foi aberta. Então, o ministro disse que tem um estudo. Nós desconhecemos esse estudo. Tem sim um problema no processo de CNH, mas tem que se sentar para conversar”, afirma Eduardo Gaúcho.
O ministro dos Transportes, Renan Filho, afirmou na última segunda-feira 26, em entrevista à Folha de S. Paulo, que o Governo Federal pretende reduzir burocracias para a emissão da Carteira Nacional de Habilitação (CNH), entre elas acabar com a obrigatoriedade do candidato passar por autoescola.
Se a proposta for adiante, o candidato poderá aprender a dirigir de outras formas e precisará ser aprovado nos exames técnico e prático para obter a CNH, mas não terá que cumprir uma carga horária mínima nas autoescolas. “O Brasil é um dos poucos países no mundo que obriga o sujeito a fazer um número de horas-aula para fazer uma prova”, disse o ministro. “A autoescola vai permanecer, mas ao invés de ser obrigatória, ela pode ser facultativa.”
Nesta quarta-feira 30, em um sinal de recuo do governo, a ministra Gleisi Hoffmann (Relações Institucionais) disse que a proposta de abolir a obrigatoriedade das autoescolas é de Renan Filho, e não do presidente Lula (PT). “A proposta de acabar com a obrigação de autoescola para habilitação é do ministro Renan”, escreveu a ministra na rede social X. “Pode ser discutida no governo, mas aí todas as áreas envolvidas no tema trânsito serão chamadas a opinar. Dirigir exige muita responsabilidade.”
Procurada, a Secretaria Municipal de Mobilidade Urbana de Natal (STTU) disse que acompanha os debates sobre o assunto e que, por enquanto, não vai se posicionar sobre o tema. Apesar disso, a STTU destacou que qualquer mudança que reflita na segurança viária deve ser observada com cautela.
O Departamento Estadual de Trânsito do Rio Grande do Norte (Detran-RN) disse que sua posição é a mesma da Associação Nacional dos Detrans (AND). Em nota publicada na terça-feira 29, a entidade levantou dúvidas sobre o projeto, pedindo que qualquer mudança preserve a qualidade da formação dos motoristas.
“Defendemos que a formação de condutores deve priorizar a segurança viária e contribuir efetivamente para a redução dos índices de sinistros e mortes no trânsito”, escreveu a AND. “A educação no trânsito salva vidas e deve ser tratada como prioridade absoluta em qualquer política pública relacionada à mobilidade”.