RECOMENDAÇÃO Nº 008/2016
O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE,
por sua Promotora de Justiça em exercício na Promotoria de Justiça da
Comarca de Florânia, no uso de suas atribuições legais conferidas pelo
art. 129, incisos II e IX, da Constituição Federal, com fundamento no
art. 127, caput, da Constituição Federal, no art. 27, parágrafo único,
IV, da Lei Federal nº 8.625/93; e, no art. 69, parágrafo único, alínea
“d”, da Lei Complementar Estadual nº 141/96; e,
CONSIDERANDO
que ao Ministério Público foi dada legitimação ativa para a defesa
judicial e extrajudicial dos interesses e direitos atinentes à infância e
juventude, inclusive individuais (arts. 127 e 129, inciso II, alínea
“m”, da Constituição Federal e art. 201, incisos V e VIII e 210, inciso I
da Lei nº 8.069/90);
CONSIDERANDO
que o Estatuto da Criança e do Adolescente, instituído pela Lei nº
8.069/90, definiu, em seu artigo 86, que a política de atendimento dos
direitos da criança e do adolescente far-se-á através de um conjunto
articulado de ações governamentais e não-governamentais da União, dos
Estados, do Distrito Federal e dos Municípios;
CONSIDERANDO
que o artigo 88 do mesmo diploma legal define como diretrizes da
política de atendimento, além de outras, a municipalização do
atendimento e a criação e manutenção de programas específicos, observada
a descentralização político-administrativa;
CONSIDERANDO
que a política de promoção dos direitos da criança e do adolescente
deve ser operacionalizada através de dois tipos de ações permanentes,
contínuas e sistemáticas, quais sejam; a) programas de políticas sociais
básicas (saúde, educação, lazer, moradia, cultura) e programas de
políticas assistenciais sociais (vulnerabilidade, carência de recursos);
b) programas de proteção especial (ameaça ou violação dos direitos
fundamentais infanto-juvenis), nos termos dos arts. 87 e 90 do ECA;
CONSIDERANDO
que a Constituição Federal, nessa mesma linha da política de
atendimento aos direitos infanto-juvenis, nos traz nas ações de
assistência social também essa “descentralização
político-administrativa, cabendo a coordenação e as normas gerais à
esfera federal e a coordenação e a execução dos respectivos programas às
esferas estadual e municipal, bem como a entidades beneficentes e de
assistência social” (art. 204, I, CF/88);
CONSIDERANDO
que uma das diretrizes da organização da Assistência Social consiste na
centralidade da família para concepção e implementação dos benefícios,
serviços, programas e projetos, conforme Resolução nº 145, de
15/10/2004, CNAS;
CONSIDERANDO
que a Política de Assistência Social realiza-se de forma integrada às
politicas setoriais, objetivando prover serviços, programas, projetos e
benefícios de proteção social básica e, ou, especial para famílias,
indivíduos e grupos que deles necessitem;
CONSIDERANDO
que a proteção social básica tem como objetivos prevenir situações de
risco por meio do desenvolvimento de potencialidades e aquisições, e o
fortalecimento de vínculos familiares e comunitários, destinando-se à
população que vive em situação de vulnerabilidade social decorrente da
pobreza, privação de renda ou de acesso aos serviços, e/ou, fragilização
de vínculos afetivos, relacionais e de pertencimento social;
CONSIDERANDO
que os serviços de proteção social básica serão executados de forma
direta nos Centro de Referência da Assistência Social – CRAS, os quais
têm a responsabilidade de executar o Programa de Atenção Integral à
Família – PAIF, que tem por perspectiva o fortalecimento de vínculos
familiares e comunitários, o direito à proteção social básica e a
ampliação da capacidade de proteção social e de prevenção de situações
de risco no território de suas respectivas abrangências;
CONSIDERANDO
que os CRAS devem ter como diretrizes metodológicas no trabalho
realizado com as famílias e indivíduos atendidos: a) potencializar a
rede de serviços e o acesso aos direitos mediante encaminhamento a
família e os indivíduos para a rede de serviços socioassistenciais
básicos e especiais, acompanhando e monitorando esses encaminhamentos
realizados; b) valorizar as famílias em sua diversidade, valores,
cultura, com sua história, trajetórias, problemas, demandas e
potencialidades mediante a valorização e fortalecimento das capacidades e
potencialidades das famílias, acreditando na capacidade da família e
trabalhar com vulnerabilidade, risco e potencialidade; c) potencializar a
função de proteção e de socialização da família através da valorização
das figuras materna e paternas; d) adotar metodologias participativas e
dialógicas de trabalho com as famílias, desenvolvendo para tanto um
trabalho interdisciplinar com uma compreensão de que a família atendida
deve ser abordada em sua totalidade;
CONSIDERANDO
que os profissionais dos CRAS na execução do Programa de Atenção
Integral à Família devem, dentre outros serviços e ações, a serem
ofertados: a) realizar acompanhamento das famílias em grupos de
convivência, reflexão e serviço socioeducativo; b) proceder visitas às
famílias que estejam em situações de maior vulnerabilidade ou risco com
vistas a melhor identificação e avaliação de vulnerabilidades e dos
procedimentos necessários para a sua superação; c) encaminhar com
acompanhamento os usuários para os serviços de proteção básica e
proteção social especial;
CONSIDERANDO
que no contexto do SUAS, a proteção especial tem como Unidade de
Referência o Centro de Referência Especializado de Assistência Social –
CREAS que é responsável pela oferta de orientação e apoio especializados
e continuados de assistência social a indivíduos e famílias com seus
direitos violados, mas sem rompimento de vínculos;
CONSIDERANDO
que o CREAS deve ofertar atenções na ocorrência de situações de risco
pessoal e social por ocorrência de negligência, abandono, ameaças, maus
tratos, violência física/psicológica/sexual, discriminações sociais e
restrições a plena vida com autonomia e exercício de capacidades,
prestando atendimento prioritário a crianças, adolescentes e suas
famílias nas seguintes situações: a) crianças e adolescentes vítimas de
abuso e exploração sexual; b) crianças e adolescentes vítimas de
violência; c) crianças e adolescentes em situação de trabalho infantil;
CONSIDERANDO
que o CREAS, sempre que necessário, encaminhará a família atendida aos
serviços de proteção básica, por intermédio do CRAS, para que o seu
acompanhamento seja realizado também na proximidade de sua moradia e com
possibilidades de acesso as demais ofertas do território de
oportunidades e serviços;
CONSIDERANDO
que da mesma forma, quando constatado pelos CRAS casos explícitos de
violação de direitos, a família deverá ser encaminhada, mediante
monitoramento e acompanhamento, aos serviços de proteção especial,
dentre eles, ao Centro de Referência Especializado de Assistência Social
– CREAS para que promovam de forma integrada, articulada e
compartilhada a sua proteção integral, cada Unidade exercendo suas
respectivas atribuições normativas dentro do Sistema Único de
Assistência Social, de forma que as intervenções não ocorram de forma
excludente e isolada;
CONSIDERANDO
que os serviços, programas, projetos e benefícios de proteção social
básica deverão se articular com as demais políticas públicas locais, bem
como se articular com os serviços de proteção especial, garantindo a
efetivação dos encaminhamentos necessários;
CONSIDERANDO
que, na proposta do SUAS, é condição fundamental a reciprocidade das
ações da rede de proteção social básica e especial, com centralidade na
família, sendo consenso o estabelecimento de fluxo, referência e
retaguarda entre as modalidades e as complexidades de atendimento;
CONSIDERANDO
que é atribuição do Conselho Tutelar atender as crianças e adolescentes
nas hipóteses previstas no art. 98, aplicando as medidas previstas no
art. 101, I a VII do ECA;
CONSIDERANDO
o número de demandas encaminhadas ao Ministério Público, sem a
observância de anterior comprovação de situação de risco ou da área de
competência deste Órgão Ministerial;
RESOLVE RECOMENDAR:
1) aos Senhores Conselheiros Tutelares de Florânia, São Vicente e Tenente Laurentino Cruz, que:
- a) apliquem as medidas de proteção que cada situação apresentada, envolvendo crianças e adolescentes requer, promovendo o acompanhamento dos casos de forma continuada através do monitoramento das medidas protetivas aplicadas, bem como quanto ao cumprimento das medidas impostas aos seus genitores, representando a um dos Juízos da Infância e Juventude desta Comarca, a quem couber por distribuição legal, o descumprimento por parte destes (art. 194 e 249 do ECA);
- b) perquira, junto as Unidades Socioassistencial de Proteção Básica e Especial (CRAS e CREAS), as ações e serviços que foram ofertados a família usuária em tela, promovendo para tanto reuniões periódicas com o desiderato de discutirem e definirem de forma articulada e compartilhada medidas necessárias a garantia de seus direitos, mormente, o direito à convivência familiar segura e saudável por parte das crianças e adolescentes;
- c) uma vez esgotadas todas as possíveis intervenções socioeducativas por parte de todos os órgãos da rede de atendimento para garantia do direito à convivência familiar harmônica, segura e saudável às crianças/adolescentes envolvidos, sendo inviável a permanência destas na família natural, que encaminhe a este órgão ministerial relatório fundamentado, no qual conste a descrição pormenorizada das providências tomadas por cada Unidade de atendimento da rede (Conselho Tutelar, CRAS, CREAS, Secretarias Municipais, Escola, Unidades de Saúde, e outras), bem como expressa recomendação, subsidiada inclusive por relatório subscrito pelos técnicos da política municipal socioassistencial, para a destituição ou suspensão do poder familiar.
2)
À Equipe de Profissionais da Unidade de Proteção Socioassistencial
Básica – CRAS de Florânia, São Vicente e Tenente Laurentino Cruz, que:
- a) insira as famílias que necessitem de sua intervenção, em oficinas de reflexão, convivência ou núcleo socioeducativo, construindo soluções para os problemas cotidianos relacionados ao cuidado de suas crianças e adolescentes, orientando sobre seu papel em relação aos filhos e auxiliando no desenvolvimento de habilidades de cuidado e socialização, garantindo-se desta forma a convivência familiar harmônica e saudável;
- b) realize o acompanhamento de referidas famílias, propiciando o seu empoderamento e fortalecimento, bem como a superação de conflitos relacionais, rompendo o ciclo de violência nas relações intrafamiliares, encaminhando-a diretamente para os demais serviços da rede socioassistencial, inclusive, de proteção especial, de forma monitorada e continuando a atender os respectivos usuários naquilo que lhe compete, conforme preconizado pelo Sistema Único de Assistência Social.
3)
À Equipe de Profissionais da Unidade de Proteção Socioassistencial
Especial de Média Complexidade – CREAS de Florânia e São Vicente, que:
- a) preste o atendimento psicossocial que as famílias em situação compatível com suas atribuições, articulando com o Conselho Tutelar e CRAS do respectivo município, uma atuação conjunta, de forma que as intervenções se complementem no atendimento desses usuários, garantido-se as crianças e adolescentes envolvidos o direito à convivência familiar saudável e seguro;
E DETERMINA à Secretaria Ministerial:
- a) Publicar esta Recomendação no Diário Oficial do Estado e, ainda, anexar uma cópia ao quadro de avisos desta Promotoria;
- b) Enviar cópia deste expediente, via correio eletrônico, ao Centro de Apoio Operacional às Promotorias da área de Infância e Juventude.
Publique-se. Cumpra-se.
Florânia/RN, 18 de julho de 2016.
TATIANNE SABRINE DE LIMA BARBOSA BRITO
Promotora de Justiça Substituta
Por Tonny Washington